Tendências: Para onde caminha o rádio em Santa Catarina

Na terceira reportagem da série especial, o Portal Making Of ouviu radiodifusores e pesquisadores para apontar como fica a programação e o conteúdo das emissoras migrantes

15/08/2017

A migração do AM para o FM é um ponto de virada do rádio em Santa Catarina. Servirá para reforçar a importância do meio, como destacado nas reportagens anteriores desta série especial do Portal Making Of, em parceria com a ACAERT (Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão). Mas também será o indicador dos caminhos que o rádio deverá seguir nos próximos anos. “A tendência é que as emissoras migrantes não mudem sua programação quando forem para o FM”, aponta Marcello Corrêa Petrelli, presidente do Grupo RIC e da ACAERT. “Quem migra e muda a programação porque agora está no FM, passa a concorrer com emissoras já estabelecidas, o que torna a disputa pela audiência muito mais acirrada”.

Entre as 19 emissoras de Santa Catarina que já migraram (até agosto de 2017), a Rádio Clube, de Lages, é um exemplo desta tendência de migrar sem mexer na programação. A emissora do Grupo SCC, com mais de 70 anos de existência, migrou para o FM em março deste ano (foto abaixo) mantendo seu perfil informativo e comunitário. No mês seguinte, já aparecia na liderança entre as FMs da cidade, sem que tenha feito qualquer tipo de alteração em sua programação. “Nós tínhamos uma expectativa menor do que aconteceu”, diz Beto Amaral, vice-presidente de produto do Grupo SCC.

Amaral lembra que o Grupo também migrou a CBN para o FM. Só que desta vez, ao contrário da Clube, a emissora mudou de nome e de programação (passou a ser musical e promocional) ao se tornar afiliada da Rede Massa e chegou ao segundo lugar nas pesquisas. “As duas rádios se complementam”, destaca Amaral. “Ou seja, acertamos na estratégia de termos rádios complementares e com enfoques bem definidos, além de termos feito campanhas de divulgação assertivas e bem planejadas”.

Sobre as campanhas para a divulgação da migração das duas emissoras, o executivo do Grupo SCC destaca as ações de rua. “Usamos as próprias rádios e os comunicadores que viraram garotos-propaganda para divulgar principalmente o novo dial tanto no caso da Clube quanto no caso da Massa”, diz. “Fizemos também muitas ações de rua, eventos e premiações, além de usarmos nosso canal de TV (SBT SC) e outdoors”.

Um novo momento para o FM

A chegada de emissoras com programações consagradas no AM tende a mexer com as “nativas” do FM. “As emissoras que já são FM certamente farão uma revisão nos atuais modelos de programação”, avalia Juciele Marta Baldissarelli, jornalista especialista em rádio e professora na Universidade Alto Vale do Rio do Peixe (Uniarp). “Mais emissoras migrando, significa mais concorrentes e com mais concorrentes, irão se sobressair aqueles que possuem algum diferencial”, diz.

Na opinião de Beto Amaral, as emissoras do FM deverão encontrar sua essência e além de definir para qual target querem fazer a sua programação, precisarão também ter bem definido qual o estilo da rádio. “De nada adianta querer uma ‘salada de fruta’ na sua grade porque o ouvinte quer colocar na sintonia e saber o que vai encontrar”, diz. “O publico está muito exigente e quer escolher o que ouvir”.

Neste novo momento, Marcello Corrêa Petrelli acredita que será necessário apresentar novidades, especialmente quando a programação que chega ao FM já é consagrada no AM. O radiodifusor diz que a tendência é que o FM seja cada mais preponderante, com o localismo sendo ainda mais valorizado. “Quem ganha com isso são os ouvintes e os anunciantes”, diz. Em regiões como Florianópolis, a tendência com a migração também será de reoxigenação do meio. “O rádio na região estava muito sem novidade e vai abrir muitas oportunidades porque tende a oferecer rádios com perfis diferentes no FM”.

Como fica o conteúdo

Ainda que manter a programação esteja dando resultado, como no caso da Rádio Clube, o conteúdo na migração do AM para o FM ainda é objeto de análise. A dúvida é saber como a mudança técnica se refletirá no conteúdo e também no comercial. “Se discute entre os pesquisadores do rádio se vai ser uma transferência de conteúdo apenas com nova ‘roupagem’ ou se haverá aposta em inovação”, diz Karina Woehl de Farias, doutoranda em Jornalismo na UFSC, professora de rádio na Faculdade Satc, de Criciúma, e pesquisadora sobre a Migração do AM para o FM.

Karina conta que já houve casos de emissoras migrantes que aumentaram a quantidade de música para concorrer com FMs, mas também houve quem mudou a programação e até o perfil dos comunicadores para atender ao público jovem. “Por isso, nesta fase inicial, acredito que teremos um pouco de tudo no dial”, diz. “Mas acredito que teremos um rádio mais falado e mais informativo, pensando nestas AMs no novo espectro e na concorrência com a programação musical das atuais FMs”.

A professora da Satc espera que a migração motive a busca pelo novo para o rádio se reinventar. Ela conta que quando as FMs surgiram, coube ao AM reforçar o jornalismo e a prestação de serviço, dando ênfase a características natas do meio para sobreviver. Por isso, para a pesquisadora, o momento agora é de repensar o conteúdo. “É preocupante ver emissoras muito mais voltadas à plástica, com a vinhetagem, do que com a necessidade de melhorar a qualidade do que vai ao ar”, diz, destacando que a migração não pode ser vista como uma mera adequação de modulação, mas sim como uma evolução.

Apesar de concordar que seja necessário pensar na reinvenção do meio, Juciele Marta Baldissarelli não acredita em grandes mudanças em termos de conteúdo nas emissoras migrantes. “O que se percebe de maneira empírica em conversas com gestores e profissionais de rádio é que na grande maioria das emissoras haverá apenas uma transferência de programação que atualmente é desenvolvida”.

Para ela, diante da migração, os radiodifusores devem levar em consideração o que seus ouvintes consomem. Juciele acredita ser audacioso afirmar o que o ouvinte quer sem que para isso seja feita uma pesquisa mais aprofundada. “Não basta apenas perguntar aos ouvintes o que eles querem ouvir”, diz. “Poderemos ter uma resposta falsa, pois as pessoas poderão responder o que elas gostariam de ouvir, mas não necessariamente ouvem”.

Crescimento da audiência

O sucesso de audiência das emissoras do Grupo SCC em Lages é um indicativo do cenário do rádio em Santa Catarina quando a migração estiver completa. “A competitividade vai ser maior, especialmente no caso da distribuição da verba do anunciante”, diz Marcello Corrêa Petrelli. Segundo ele, a tendência é que em vez de anunciar nas líderes por faixa, o anunciante passará a investir por audiência ou por perfil do público no FM.

Para Beto Amaral, com a migração do AM para o FM, todas as rádios estarão na mesma faixa e assim a busca pela audiência, vai ser pela qualidade de sua programação, não mais pela qualidade de áudio. “Assim as emissoras que não investirem, não inovarem e que não tenham seus produtos voltados ao cliente (ouvintes e mercado) irão sucumbir”, diz.

As pesquisadoras Karina Whoel Farias e Juciele Marta Baldissarelli também acreditam em crescimento de audiência do rádio em Santa Catarina. Força da marca, qualidade sonora, fidelidade do ouvinte e presença do público jovem são alguns fatores que influenciarão no sucesso das migrantes. Mas elas também reforçam a necessidade de analisar formatos e montar uma programação que atenda aos anseios e cative os ouvintes. “O ouvinte fiel deve ir junto a emissora de costume, mas a concorrência no FM será maior, principalmente quando o assunto é a publicidade”, diz Karina.

Juciele vê a migração da audiência das emissoras AM para o FM como algo natural. Ela diz que no princípio poderá haver uma certa resistência especialmente aos mais habituados apenas a ligarem e desligarem seus aparelhos, sem alterar de estação. “Mas em termos de qualidade de som, o FM é melhor e quem é habituado a ouvir esse tipo de emissora, estranha quando se depara com os ruídos do som AM”, destaca. “Também percebemos uma concentração maior dos jovens prestigiando as FMs, o que de fato poderá auxiliar o rádio a ser um meio de comunicação prestigiado”.


Este é o terceiro texto da série A Força do Rádio. Nos próximos serão abordados temas como “Interatividade no rádio”, “O rádio multiplataforma”, “Os desafios do profissional do rádio”, além do “Dossiê da Migração” com todas as informações sobre este momento especial para o meio.

Repórter: Alexandre Gonçalves, especial para o Portal Making Of

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