Digitalização de fitas doadas a Florianópolis por Zininho permite resgate da memória do rádio

O poeta e compositor, que morreu em 1998, doou 1.200 fitas à Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes

24/03/2016

Leonardo Lemos diz que digitalização irá democratizar acesso ao material (foto: Eduardo Valente/ND)

Uma parte substancial da história da cidade que está completando 343 anos nesta quarta (23) foi contada pelas ondas do rádio. Foi por meio desse canal que muitos florianopolitanos puderam testemunhar a transformação urbana operada da metade do século passado para cá, os principais fatos políticos locais e nacionais e a vida social da Ilha, em permanente ebulição.Pelo rádio eles acompanharam episódios relacionados ao pós­guerra, a partir de 1945, ao golpe militar de 1964, a eventos estaduais de grande repercussão e a acontecimentos culturais e esportivos que sempre despertaram o interesse dos manezinhos. Poucos registros dessa memória ficaram, mas o cuidado de um ilustre filho da terra, o poeta e compositor Cláudio Alvim Barbosa, o Zininho (1929­1998), pode salvar uma fatia daquilo que não chegou às novas gerações. São 1.200 fitas de rolo de ¼ polegada que a família do artista confiou à Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes, braço cultural da prefeitura da Capital.

Desde a primeira semana de março, esse acervo vem sendo digitalizado pela empresa Triscele Web e Museologia, que capta o áudio, remove as impurezas sonoras e regrava o conteúdo de noticiários, entrevistas programas especiais das rádios Diário da Manhã e Guarujá, onde Zininho trabalhou como rádio­ator e técnico de som. Até dezembro, de acordo com contrato assinado entre a empresa e a fundação, todo o material estará disponível em formato digital e poderá ser oferecido à consulta e à pesquisa dos interessados. O acervo abarca o período dos anos 1940 a 1970, mas as cerca de 30 fitas já ouvidas contêm também coisas da década de 1980, como uma entrevista com Hebe Camargo e uma reportagem sobre o pintor Juarez achado, então já vivendo em Paris.

Batizado de Memória Digital, o projeto está sendo executado com recursos que a Fundação Franklin Cascaes, através da Diretoria de Patrimônio, conseguiu pelo Edital Elizabete Anderle, da Fundação Catarinense de Cultura, no valor de R$ 50 mil. Depositária do material, a Casa da Memória tem também 1.500 fitas cassete doadas por Zininho, mas a sua digitalização depende da aprovação de outro projeto, já que a FFC não tem orçamento para isso. Embora a pesquisa da Triscele esteja no começo, sabe­se que as fitas de rolo reúnem amplo material da radiodramaturgia dos anos 1940 aos 1970, quando as radionovelas eram a coqueluche do rádio em Florianópolis.

A empresa Triscele está executando os trabalhos após ser contratada em licitação (Eduardo Valente/ND)

 

De anúncios comerciais à radionovelas

Contratada por meio de licitação, a empresa Triscele está executando o trabalho em etapas, selecionando e levando dez fitas de cada vez para o escritório que mantém num prédio próximo à Casa da Memória, no Centro de Florianópolis. Ali, é feito um diagnóstico da situação do material, que tem tamanhos e marcas diferentes. Após a limpeza e higienização, ele é capturado para a devolução das fitas e a análise de uma nova remessa. A digitalização vai permitir que o público tenha contato, por exemplo, com as radionovelas que prendiam a atenção do público, como depois aconteceu com as telenovelas. “Ainda não sabemos tudo o que o material contém, mas há muitos áudios de noticiários e entrevistas”, diz o museólogo Leonardo Lemos, um dos sócios da Triscele. “Também há matérias com figuras importantes e anúncios veiculados à época, especialmente pelo comércio local. Já vimos notícias do bar Miramar e do tombamento do Teatro Álvaro de Carvalho. Havia o risco de o tempo destruir as fitas, mas a digitalização em curso ajudará a Fundação Franklin Cascaes a montar um banco de dados que irá democratizar o acesso a essas informações”.

O museólogo Jonei Bauer, coordenador da equipe de trabalho, informa que a Triscele, criada há sete anos, vem executando outros projetos de digitalização de acervos em Santa Catarina e que a demanda por esse tipo de serviço tem aumentado. De sua parte, a Casa da Memória guarda um acervo de 40 mil objetos, entre fotos, livros, fitas e até equipamentos de rádio doados pela família de Zininho, que estão ali desde 2004, sem a devida conservação. O espaço é um arquivo histórico não oficial da cidade e tem recebido muitas doações, às vezes de pessoas anônimas que depositam um envelope com fotos embaixo da porta de entrada, sem identificar nomes ou atas. Como no restante da estrutura da Fundação Franklin Cascaes, a casa não tem um corpo técnico próprio – todos os funcionários são cedidos por outras secretarias do município.

Repórter: Paulo Clóvis Schmitz - Notícias do Dia

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